Dos 30 aos 40

Aos 30 anos fiquei grávida, e creio que para o Wande, esta foi uma das coisas mais importantes da sua vida. Dancei até o quinto mês de gestação, e em uma das viagens com a Cia eu estava lendo a biografia da Isadora Duncan, onde ela relatava que a sua melhor amiga tinha sido Eleonora Duce, italiana e uma grande atriz de teatro. Decidi então que o nome da minha filha seria Isadora, em homenagem as duas grandes estrelas e amigas.
No final da gravidez precisei ficar em repouso e não pude ir para a praia no verão. Isadora nasceu em 10 de fevereiro de 1988, tinha o cabelo e os olhos bem pretinhos, um rostinho redondo e já era muito simpática. Chamava-a de "Feijãozinho".

Aos poucos os cabelos dela foram clareando e os olhos ficando azuis. A nossa boneca então surge com toda a força e encantando a todos.


Batizado da Isadora, os padrinhos minha irmã Luiza e Jair Moraes













Voltei a trabalhar no balé três meses depois do nascimento da Isadora. Um pouco depois de retornar ao trabalho, o Wande foi convidado para participar do 26º Festival Internacional de Dança em Paris, e precisava levar algumas obras para as apresentações.

O nosso diretor Carlos Trincheiras então decide que levaríamos um dueto neo clássico, da obra "Inter rupto", um trabalho maravilhoso. Com muito custo conseguimos apoio para irmos ao festival. Na banca de jurados estava Rolin Petit, um coreógrafo muito prestigiado, e as apresentações seriam no Theatre Champs Elysées - o famoso teatro em que Nijinski dançou a Sagração da Primavera.

Um fato interessante aconteceu neste festival: assim que nos apresentamos e saímos do palco, um francês, coordenador do festival, veio até nós fazendo muitos elogios e perguntou se eu poderia fazer o dueto sem as  sapatilhas de pontas, pois eles consideravam que a obra se encaixaria melhor no estilo contemporâneo. Nisto um diretor inglês que escutou a conversa ficou indignado e começou a discutir com o coordenador dizendo que aquilo seria um absurdo, e que os ingleses sempre faziam obras como a nossa sem descaracterizá-las.

Voltamos dois dias depois, e o coordenador nos informou que a banca gostou tanto da nossa apresentação que nos colocou como Hors Concours do festival, para participar no final da gala oficial. Ele então nos disse: "É para nós irmos com a linda imagem deste dueto para a casa". Foi um presente!

Jornal Gazeta do Povo


O vídeo é do dueto "Inter rupto", e a apresentação foi no teatro Ópera de Arame, para o programa que o Clodovil fazia na época.

Família completa e linda, registrada pela câmera de Ruy Tavares, fotógrafo e amigo maravilhoso.

Na praia: Washington, grande amigo, Wande, Gui, mãe, pai, Martha e Isadora

As bailarinas mais jovens do teatro começaram a me chamar de "madrinha". Eu dava conselhos amorosos, sexuais, profissionais e familiares para elas. Sempre acreditei ser importante apoiar as pessoas e transmitir conhecimento para os mais novos.
Gui e Isadora - participação especial em "O Grande Circo Místico"

Sempre digo que formamos uma família de Circo. Os filhos nos acompanhando nos ensaios e apresentações, fazendo algumas pequenas participações e interagindo com o ambiente artístico.


Dancei muitas obras de coreógrafos internacionais e nacionais que eram convidados para trabalhar com a Cia. Os estilos eram diversos e isto para mim foi muito importante para ampliar o meu olhar e exercitar novas propostas artísticas.
"Pastoral", coreografia de Milko Sparembleck






 "Exultate Jubilate" com o Wande obra de Vasco Welemkemp
"Pavana" com Jair Moraes obra de Luz Arrieta

"Treze Gestos" coreografia de Olga Roriz




Vídeo eu e o Wande, dançando o dueto "Reino das Neves, do balé O Quebra-Nozes"



 

Como a família tinha crescido, resolvemos vender o nosso apartamento no centro e comprar uma casa num bairro no Alto da XV. Ela fica numa rua sem saída, que tem uma grande praça que interliga à outras ruas. Coloquei malvas vermelhas nas floreiras e as janelas têm a cor verde. É uma casa italiana! Como disse a Ana Botafogo quando veio nos visitar: "Parece a casa da Giselle, personagem do famoso ballet romântico que leva o mesmo nome ". Nosso filhos cresceram brincando na rua e fazendo muitos amigos na região.
Gui e Isadora em frente a casa nova que estava em obras
Casa no Tarumã, na Rua Constantino Alves dos Reis, nº 68 
















Adoramos viajar e  em algumas fomos somente eu e o Wande e em  outras com os filhos, sobrinhos e amigos dos filhos.
 As viagens sempre nos ensinaram e muitas situações interessantes aconteceram nestas andanças.

Eu e o Wande fomos a Cuba numa época em que estava acontecendo a Guerra do Golfo, e os turistas europeus que estavam por lá não queriam retornar para seus países, por medo de que a guerra se alastrasse pelo continente.
O Wande estava com barba, parecendo com o Che Guevara, e em uma das vezes que pegamos um ônibus de linha, as estudantes que estavam sentadas, olharam para ele e sussuraram: "el Che, el che, el che". Morremos de rir!!!
Cuba e um lindo mar azul turqueza
Os cubanos não podiam conversar conosco, nem circular nas prais onde estávamos, ficavam aguardando nas filas enormes em frente aos restaurantes, enquanto os turistas tinham prioridade porque portavam "dólares". As crianças vinham nos pedir canetas esferográficas e revistas. Um rapaz nos seguiu até o hotel só porque o Wande prometeu lhe dar uma camiseta com estampa.
E teve o episódio das garçonetes de um restaurante onde comíamos que me pediram para que comprássemos para elas calças compridas, sabonete e carteira com velcro nas famosas "Tiendas", em que só estrangeiros podiam entrar e fazer compras. Foi sinistra esta situação, pois elas me chamaram no banheiro e me deram alguns dólares todos amassados...nem imagino aonde estavam guardados! Tive que entregar as encomendas para elas dentro do banheiro, num pacote camuflado...Fiquei apavorada, com medo que a polícia do Fidel me pegasse e me prendesse!

Neste mesmo ano fomos a Termas de Jurema, que fica na região central do Paraná. É um lugar delicioso que tem piscinas com águas termais e lama preta medicinal.

Cobertos com lama preta: eu, tia Orietta, Wande e Paulinho nosso sobrinho

Na Cia, tivemos a montagem do balé D. Quixote. O personagem principal da Kitri era o mais importante e que exigia preparo físico e muita técnica. Num dos ensaios eu caí, e por pouco não tive um rompimento nos ligamentos do pé direito. Como estava preocupada e sabia que seria difícil a minha recuperação, fui conversar com o nosso diretor Carlos Trincheiras, pedindo que ele colocasse outra bailarina para fazer o papel, pois além  de eu ter certas dificuldades técnicas  ainda estava machucada. Ele me olhou e disse: " Greca, eu preciso de uma atriz em cena, e não somente uma executora de passos. Você é a pessoa ideal, pois irá  interpretar o personagem do começo ao fim do espetáculo. Você ficará boa e fará a estréia do balé, não irei substituí-la."

"D. Quixote" com a Cia
Em 1993 o nosso diretor da Cia, Carlos Trincheiras morre e foi um choque para todos nós, pois estávamos em temporada e tivemos a notícia na hora de entrarmos em cena. Mesmo com o coração despedaçado, fizemos o espetáculo.
Isabel Santa Rosa, esposa de Carlos Trincheiras e uma das maiores bailarinas de Portugal, assume a direção da Cia por pouco tempo, e no final do mesmo ano, eu e o Wande fomos convidados para dançarmos em Lisboa, em uma homenagem ao Trincheiras. Aproveitamos a viagem e fomos conhecer a Espanha e a Itália.

Eu e Wande em Lisboa, com os bailarinos Daniela  e Jurandi

Jair Moraes, nosso primeiro bailarino, assume a direção da Cia, em 1994. Um dos trabalhos mais marcantes desta época foi a montagem de "O Mandarim Maravilhoso" com coreografia de Julio Mota. É  a história de uma prostituta que se apaixona por um mandarim. A coreografia é bem teatralizada, com figurinos e maquiagens muito fortes.
"O Mandarim Maravilhoso"
Trecho de "O Mandarim Maravilhoso"


Neste mesmo ano fomos convidados para participar do Festival das Águas em Pusan, Coréia do Sul. Formamos um grupo de oito bailarinos e um ator e encaramos este desafio. Foram vinte dias de uma experiência incrível, em que mergulhamos na cultura oriental. O espetáculo era uma mescla de vários ritmos brasileiros e foi um sucesso. No último dia do festival dançamos num palco montado em uma praia, para mais de cinco mil pessoas.
Na volta passamos para conhecer Seul, a capital. Super organizada e avançada.

Matéria do Jornal Gazeta do Povo 

Na Coréia: Thiago, Sergio, eu, Carla Almeida, Wande, Carla Moita, Ailton, e Mozart

Com os filhos, viajamos de navio pela costa sudeste e nordeste do país, apreciando nosso país que é maravilhoso, que tem tantas belezas naturais e pessoas incríveis.

Passeio de navio por Santos, Salvador, Rio de Janeiro e Espírito Santo

Ao longo da carreira , recebi várias homenagens, entre elas: Honra ao Mérito do Clube Soroptimista Internacional, Câmara Municipal de Curitiba, "Bicho do Paraná" pela Rede Paranaense de Televisão, Centenário do Teatro Guaíra, Conselho Brasileiro de Dança e Rainha dos Artistas.

Homenagem ao Dia Internacional da Mulher  na Câmara Municipal de Curitiba





Rainha dos artistas

Recebendo a medalha pelo centenário do Teatro Guaira

Em 1996, eu criei a empresa Eleonora Greca Produções Artísticas, com a logomarca criada por minha tia Nair e produzi vários espetáculos para a Associação Médica do PR, Associação Comercial e Secretaria da Educação. Ficamos mais de dois anos em viagens para Faxinal do Céu, no interior do Paraná, levando o espetáculo "Dança para Todos". Era um espetáculo didático, voltado para professores de escolas públicas, que contava a história da dança, alternando textos falados com trechos dançados dos ballets. Os depoimentos que tivemos destes professores foram comoventes.

Flyer de divulgação de "Dança Para Todos"
No final deste ano recebi um dos maiores presentes da minha carreira. Marcia Haydée, grande estrela da dança mundial veio remontar o espetáculo "Copelius, O Mago"para a Cia.  Acabei sendo escolhida para fazer um dueto belíssimo no segundo ato, era o personagem da "Fada do Amor". Muito além desta participação o convício com Marcia foi indescritível. Ela sempre com uma alegria contagiante e uma sensibilidade incrível no trato com os bailarinos.

No vídeo, o dueto da "Fada do Amor", com o bailarino Ricardo Garanhani.

















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